quinta-feira, 22 de setembro de 2011

HISTÓRICO DO ESTUDO DA BÍBLIA NA IGREJA CATÓLICA

Século XVI:
A Reforma Protestante foi um movimento reformista cristão que ocorreu no início do século XVI por Martinho Lutero quando, através da publicação de suas 95 teses, em 31 de outubro de 1517 na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, protestou contra diversos pontos da doutrina da Igreja Católica, propondo uma reforma no catolicismo. Os princípios fundamentais da Reforma Protestante são conhecidos como os Cinco solas. Entre elas, destacamos aquela que nos interessa: sola scripturas. Como esta afirmação, Lutero quer dizer que somente a Escritura pode ser considerada como Revelação Inspirada, não podendo existir outra fonte, ainda que baseada na Escritura. Portanto, nem a Tradição em nem o Magistério eclesial são inspirados, somente a Escritura.
O Concílio de Trento, realizado de 1545 a 1563, foi o 19º Concílio Ecumênico. É considerado um dos três concílios fundamentais na Igreja Católica.  Foi convocado pelo Papa Paulo III para assegurar a unidade da fé e a disciplina eclesiástica, no contexto da Reforma da Igreja Católica e a reação à divisão então vivida na Europa devido à Reforma Protestante, razão pela qual é denominado também de Concílio da “Contra-Reforma”. Como os cristãos seguidores de Lutero ficaram somente com a Escritura como única fonte de Revelação, então a Igreja teve de reafirmar sua doutrina sobre os sacramentos. Assim, os protestantes se tornaram apegados somente à Bíblia, enquanto que os católicos aos sacramentos e o estudo da Doutrina (Catecismo). A Bíblia se tornou para os católicos um “perigoso” livro, mesmo sendo santo, poderia ser fonte de confusão.

Século XIX:
Após o Concílio de Trento, a tendência ao esfacelamento dos valores da Idade Média mais e mais se fez sentir. A Revolução Francesa (1789) significou o brado da razão e do racionalismo contra a fé. Seguiu-se-lhe o século XIX , que foi marcado pelo materialismo e o ateísmo fora da Igreja, e dentro da Igreja pelos ecos das tendências conciliaristas e do separatismo, que solapavam a autoridade papal e a unidade da Igreja. Foram esses fatores que induziram o Papa Pio IX (1846-78), aconselhado por eminentes figuras do episcopado e do laicato católicos, a convocar o 20º Concílio Ecumênico para o Vaticano. A grande assembléia de 764 padres conciliares se reuniu de 8/12/1869 a 20/10/1870, tendo por objetivo fazer frente ao nacionalismo do século XX, como o Concílio de Trento fizera ao protestantismo do século XVI. Diga-se de passagem, que foi o próprio protestantismo que contribuiu, e muito, para a difusão de um pensamento racionalista, cavando para si uma sepultura.
Por causa de tudo isto o Papa Leão XII, em 1893 lança a Encíclica Providentissimus Deus a respeito do estudo da Bíblia na Igreja Católica, a fim de responder à crescente insurgeição de um racionalismo que não aceita a Bíblia como um livro inspirado, pois revelava contradições com as recentes descobertas científicas. Portanto, a Bíblia não poderia ser Palavra de Deus inspirada porque encontravam-se erros científicos.

Século XX:
Um documento lançado em 1920 – a Encíclica Espíritus Paraclitus – por Bento XV, por ocasião do 15º centenário da morte da São Jerônimo retoma, além de um histórico da vida do Doutor Máximo, o tema do estudo das Sagradas Escrituras, continuando o pensamento já presente na Providentissimus Deus.
Também em 1943 foi lançada outra carta Encíclica chamada Divino afflante spiritu de Pio XII por ocasião do 50º aniversário da Providentissimus Deus, na qual percebe-se uma grande abertura ao estudo profundo da Bíblia. Uma abertura que não se tinha notado na Igreja até então, pois se tinha mantido muito reservada por causa de sua prudência; em relação aos tristes fatos ocorridos no início do século na École Biblique. O Pe. Loisy, O.P. estudando o Antigo Testamento, descobriu que a história da criação já estava presente em mitos antigos da Babilônia, sem levar em conta que a Bíblia reinterpreta estes mitos à luz da fé no verdadeiro Deus, professada por Israel, concluiu que a Bíblia não era inspirada e perdeu a fé. Um grande escândalo que paralizou os estudos bíblicos por quase 50 anos. Os dominicanos da École Biblique et Archéologique Française de Jérusalem (EBAF), inclusive o fundador Pe. Marie-Joseph Lagrange, foram proibidos de estudar o Antigo Testamento, tendo que se contentar só com o Novo Testamento.
Por isso, a Divino afflante Spiritu, juntamente com a carta da Pontifícia Comissão Bíblica ao cardeal Suhad (Arcebispo de Paris – a escola é francesa, não esqueçamos) representaram uma grande reabertura aos estudos bíblicos na Igreja Católica.
O Concílio Vaticano II, XXI Concílio Ecumênico da Igreja Católica, foi convocado no dia 25 de Dezembro de 1961, através da bula papal Humanae salutis, pelo Papa João XXIII. Este mesmo Papa inaugurou-o, a ritmo extraordinário, no dia 11 de Outubro de 1962. O Concílio, realizado em 4 sessões, só terminou no dia 8 de Dezembro de 1965, já sob o papado de Paulo VI. Deste concílio temos a Constituição Dogmática Dei Verbum, que foi a resposta esperada desde o Concílio de Trento a respeito do estudo da Bíblia.
Em 1993 a Pontifícia Comissão Bíblica, por ocasião do centenário da Providentissimus Deus de Leão XII e cinquentenário da Divino afflante spiritu de Pio XII, o então cardeal Joseph Ratzinger entrega para a promulgação de João Paulo II. O título do documento é A Interpretação da Bíblia na Igreja.
Século XXI:
O último documento a respeito do estudo das Sagradas Escrituras foi a Exotação Pós-Sinodal Verbum Domini do Papa Bento XVI em 2010, a qual é o documento final do Sínodo dos Bispos realizado em 2008 no Vaticano. A partir desse pequeno trecho do documento podemos aurir o que a Igreja espera de todo crente: “Desejo uma vez mais exortar todo o Povo de Deus, os Pastores, a pessoas consagradas e os fiéis leigos a empenharem-se para que as Sagradas Escrituras se lhes tornem cada vez mais familiares. Nunca devemos esquecer que, na base de toda a espiritualidade cristã autêntica e viva, está a Palavra de Deus, anunciada, acolhida, celebrada e meditada na Igreja” (Bento XVI, Exortação Pós-Sinodal Verbum Domini, N. 121, p. 213). É importante frisar que desde o Concílio Vaticano II se esperava um sínodo sobre a Palavra de Deus.



Elaboradores: Ir. Pe. Lauro Freire Alves Filho, NJ e Ir. Franklins Marques Torres, NJ